ALGUMAS CURIOSIDADES DA NOSSA TERRA...(I)
A FLORESTA DO CONCELHO DE ÍLHAVO NOS ANOS 30
Em 1930 a área total das areias da floresta do concelho de Ílhavo era superior a 1.200 Ha, cerca de 800 para sul da estrada Ílhavo - Costa Nova e 400 para norte. De 1926 a 1931 foram semeados 622 Ha de pinheiros no concelho.
Nessa altura, havia as seguintes casas da Mata: Guarda Velha junto à carreira de tiro da Gafanha de Aquém; Guarda Branca junto à Gafanha da Nazaré; Guarda Nova na Gafanha da Encarnação, junto à estrada que seguia para sul e dimanava da estrada Ílhavo - Costa Nova; Guarda do Carmo entre Vagos e Ílhavo, na extrema dos concelhos. O encarregado destas sementeiras foi o zeloso Sr.º Levi dos Santos Reigota, acompanhado por vários empregados da Florestal e largas dezenas de jornaleiros e jornaleiras, que além das sementeiras também fiscalizavam os trabalhos
CAFÉ RECREIO ARTÍSTICO ou RECREIO ILHAVENSE
No rés-do-chão do antigo Museu (anos 20/30), chegou a funcionar um café/clube com o nome de Recreio Artístico/e Recreio Ilhavense, alugado pelo pai do Sr.º Cândido Rocha!! Tinha uma orquestra privativa que animava os bailes, sendo trespassado em Maio de 1931, para os Bombeiros de Ílhavo. Mais tarde é Henrique Rato, baterista do Liberdade Jazz, que fica com o estabelecimento. Esta casa de recreio tinha um regulamento próprio e os utentes só o poderiam frequentar, mediante o pagamento de uma cota.
Cândido Rocha (Pai)
Cândido Rocha (Filho)
Henrique Rato
Jantar de confraternização no Salão de Festas do Illiabum Clube
(Semedo, prof. José Lau, Hilário, Pinho, António e João Bagão Félix, Ferreira Jorge e Franco) Foto de Tó Ju
Procissão do S.Jesus dos Navegantes em 5 de setembro de 1971
Foto de Tó Ju
Nos anos 90, durante o mandato de João Teles como presidente da direcção da Música Nova, entre outras actividades, adquiriu-se um novo instrumental completo, informatizou-se a base de dados das partituras existentes e lançou-se um repto ao maestro da altura, Artur Pinho, no sentido de "colocar na estante", uma peça musical dum autor Ilhavense, dentre as várias existentes no espólio da Banda. A escolha recaíu em Berardo, do compositor Armando da Silva e a estreia realizou-se num concerto efectuado no Jardim Henriqueta Maia.
Postal de Vitor Peixe (já falecido), enviado num passado Natal a desejar Boas Festas. Existe ainda na Gruta esta pintura feita em tempos idos, por Vítor Peixe, com a conhecida quadra do Eng.º António Picado:
E as ondas do mar lambendo
O convés do teu veleiro
Lembram carícias distantes
Em rostos de marinheiro
Recorte duma entrevista de Vitor Peixe no programa Recordar É Viver em 05-01-1993
Noutros tempos existiam em Ílhavo três cocheiras e respectivas cavalariças. A mais antiga era do Ti Domingos Ramalheira, no Cimo da Rua de Camões, que dispunha de um belo landau ( carruagem de 4 rodas puxada a cavalos e coberta com tejadilho que se pode cobrir ou descobrir), que só era utilizada em casamentos ou baptizados; a do Ti Catão (pai do Prof. Duarte Pinho), muito próxima da outra, situada no Beco da Manga, a do Ti Peles em Cimo de Vila e a do Parracho, em Espinheiro. Anos mais tarde apareceu o Ti Manuel de Jesus Bilelo, que morava no Urjal e que dispunha de um carro para 4 pessoas, puxado a um cavalo e que ao tempo, transportava as raparigas que frequentavam a Escola Primária Superior, em substituição da antiga Escola Normal, para professores primários. Os embarcadiços (capitães e marinheiros) também os utilizavam, quando pretendiam alcançar o caminho de ferro em Aveiro, com destino ao Porto ou Lisboa e também os músicos quando se deslocavam p.ex. para as cerimónias da Semana Santa na Lavandeira. A bicicleta era o meio de transporte mais usado, até pelos médicos nas consultas que faziam aos seus doentes. Só mais tarde o Dr. Samuel Maia, que morava em Espinheiro, adquiriu um Ford, com faróis alimentados a acetilene.
A Fontoura tem andado em estado de sítio! Uma revolução que tem arrastado até ali, curiosos e jornalistas. O povo até já quis ver milagres, onde há apenas água jorrando da terra em abundância. Na Fontoura houve noutros tempos uma fonte. A canalização dessa fonte, cuja água vinha da Rua Direita, permaneceu, depois de extinta a fonte Quando da instalação da luz eléctrica, é provável que algum poste tivesse danificado a canalização. E a água, limpida e fresca, começou de brotar lá em baixo, junto à casa do sr. Luís Bingre. Mas a água tem caprichos. A água é boémia. E um dia, a água cantante e borbulhante, entendeu que devia começar de brotar noutro sítio. Talvez perto duns olhos lindos que ali moram. Uns olhos fradescos perscrutantes. Foi o diabo! Já não havia explicação para o caso. O povo da vizinhança, passava horas, ladeando a nascente, comentando, fitando o borbulhar da água. Mas o diabo tece-as. Não gosta que brinquem com ele. E a água...transfeiriu de novo o seu despontar à face da terra. Surgiu mais acima. E os homens da câmara lá andaram enleados, atrás da água caprichosa que fugia de aqui para brotar acolá, límpida, caprichosa, acirradora. E que era então? Era água, água e só água muito fresca e nada mais. E vai então, vejam vocelências, os habitantes da Fontoura, que até aí não tinham água de Verão, ficaram, por artes estranhas, e diabólicas, tendo à porta, água em abundância. E fica explicado o milagre!
O Cónego José Luís Rangel Pimentel de Quadros, Arcipreste Reitor da Freguesia de Sosa, mandou fundar e adornar à sua custa, esta Capelinha com a invocação de Sto. António, sendo inaugurada no dia 28 de Maio de 1868
Nesta Capelinha faziam-se, antigamente, as cerimónias da Semana Santa, onde tocaram alguns músicos Ilhavenses, tais como João Carolla, Dr. José Luís Mano Dias, Guilhermino Ramalheira, Armando da Silva e outros. O coro onde actuavam (foto a seguir à Capelinha) era muito pequeno, dificultando o desempenho dos músicos. O trajecto de Ílhavo para a Lavandeira era feito, geralmente, num carro de um só burro. O pároco era o conhecido Padre Manuel Ribeiro, proprietário da Capelinha.
O primeiro número do jornal "Os Sucessos" saiu em Julho de 1888, sendo seu director, Marques Vilar e a redacção no Corgo Comum, onde hoje está instalada a firma Venepneus.
Obituário, Crepes, Fúneres e Necrologia eram os termos utilizados pela nossa imprensa para anunciar os falecimentos em Ílhavo
Délivrances os nascimentos
Notícia do Jornal Nauta (director Procópio de Oliveira) em 1908:
Com a simpática tricaninha M.S. consorciou-se o também simpático nauta ilhavense J.M.F.. Os noivos foram de landaus ao acto religioso, paraninphando por parte do noivo J.C. e da noiva M.J.. Ao novo par desejamos uma interminável lua de mel.
A nossa Igreja Matriz foi começada a construir em 3 de Outubro de 1776, tendo custado 6.195$00. O arrematante da obra foi José Rodrigues Ferreira, de Ovar. A 23 de Junho de 1785 enterrou-se a 1ª pessoa nesta igreja: o padre João António da Costa da Juliana
Dizia um pescador em 1904: " O quartilho de vinho havia de ser uma caneca tão grande que tivesse uma asa do tamanho do Arco da Velha"!!
O nome da Travessa do Professor na rua Direita foi dado em honra a Domingos Gomes Galvão, primeiro professor de latim em Ílhavo e que lá habitou no princípio do séc. XIX.
Quando nos festejos da Nª Srª do Pranto se erguiam dois arcos....
Na foto a preto e branco (tirada em 1965) pode ver-se lá ao fundo o 2º arco.
O primeiro arco foi construído por Luís Parola em 1800 (tinha o formato dos arcos normais das ornamentações, portanto semi-circular);os outros mais recentes, foram construídos por Francisco Barreto e por Casimiro Pires.
O café Coração da Praia na Costa Nova foi inaugurado em Setembro de 1904. Além de café tinha um salão de baile muito afamado.
O grande poeta ilhavense Alexandre da Conceição encontra-se sepultado em Viseu.
No dia 6 de Fevereiro de 1876 foi inaugurado o Teatro Recreio Artístico, local onde hoje se encontra a loja dos Vizinhos na Rua Serpa Pinto. Foi sede do Clube dos Novos entre 1905 e 1926 sendo largamente referenciado nos Jornais da época, através das muitas festas, teatros e bailes lá realizados. Ainda hoje se podem admirar as suas belas pinturas interiores. A inauguração foi feita com a peça "Camões do Rocio"
Em Junho de 1838 ainda não estava terminado o cemitério da vila, sendo os corpos sepultados no adro da Igreja
Orquestra da reposição da revista Galeota nos Bombeiros Voluntários de Ílhavo (15 de Maio de 1993):
Orquestra da reposição da revista Nossa Escola nos Bombeiros Voluntários de Ílhavo (28 de Novembro de 1992):
Programa da Semana Santa em Ílhavo no ano de 1922:
Domingo de Ramos: 11 H Benção dos Ramos seguida de Missa
5ª Feira Santa: 11 H Missa
15 H Lava Pedes
16 H Ofício das Trevas
18.30 H Procissão
6ª Feira Santa: 9 H Missa
13 H Procissão
17 H Ofício das Trevas
Sábado de Aleluia: 9 H Benção do Círio Pascal e Missa
19 H Ladaínha à Nª Senhora
Domingo de Páscoa: 10 H Procissão
11 H Missa
Fotos de António Rosalino
O Clube dos Sucenas deu origem ao Clube dos Novos em 1912. A sua sede era na Rua de Espinheiro no prédio do sr. José Rodrigues e os secretários da Assembleia Geral eram o padre Ângelo Ramalheira e padre Manuel de Campos. O presidente da direcção era o Dr. Joaquim Machado da Silva.
Nos anos 20 e 30 havia festa da rija em honra a Santo António da Igreja Matriz
Em 1925 foram oferecidas ao Museu de Ílhavo as produções musicais do conterrâneo José Nunes Baptista
O Clube dos Novos extinguiu-se a 7 de Janeiro de 1926
O Salão Cinema (Texas) foi inaugurado em Abril de 1927 no dia de Páscoa
Vitorino Mendes Maia faleceu a 10-08-27; foi regente da Música Nova durante 25 anos, compondo passos dobles e marchas fúnebres. Era apontador na fábrica da Vista Alegre
Em Dezembro de 1931 estreou-se a opereta em 2 actos "Noite de Agoiro" do Dr. Celestino Gomes com música de D. José Pais
Em Março de 1933 o Salão Cinema encerrou para obras fazendo também a despedida o cinema mudo em Ílhavo. Reabriu em Abril deste ano, com uma boa instalação Sonor, mês em que estriou a Revista "Com Papas e Bolos" no dia 2
A 15 de Fevereiro de 1911 começou a ser demolida a Capela das Almas, que afirmavam estar em ruínas, mas verificou-se, ao demoli-la, que afinal se encontrava bastante sólida e sem grandes problemas de desabamento
Em Fevereiro de 1911 começaram os ensaios duma estudantina dos sócios do Recreio Artístico (antiga loja dos Vizinhos), que tencionavam sair no Carnaval deste ano, cantando uma balada com letra do cónego José Maria Ançã e música de João Carolla, para angariação de fundos de um bodo aos pobres
Em Maio de 1936, o novo estandarte do Município, transportado por José Celestino Pereira Gomes, deu entrada na vila
Na procissão das Cinzas de 1937 a Música Velha tocou uma linda marcha de Berardo Pinto Camelo, inspirada na música "Caravelas" da Nossa Escola
Em Janeiro de 1939 deu-se a demolição do Teatro Municipal de Ílhavo
Em 1939 houve uma 2ª festa do Senhor Jesus dos Navegantes em 19 e 20 de Novembro organizada por marinheiros, motoristas, cozinheiros e oficiais; participou a Música Velha
Em Janeiro de 1947 a Música Velha passa para a Travessa da Filarmónica para um edifício propriedade de Eduardo Vaz Craveiro
Num cortejo realizado em 21 de Dezembro de 1947 a favor do Hospital a marcha foi composta por João da Madalena
Em 18 de Abril de 1948 houve festa de S. José na capela da N.S. do Pranto em Cimo de Vila com a participação da Música Velha
Carlos Bilelo destacado elemento da Música Nova faleceu a 15 de Abril de 1948
Em 11 de Junho de 1950 à tarde é colocada no terraço do quartel dos B.V.I. uma sirene Siemens que se ouvia num raio de 3 Kms e oferecida pela Câmara, substituindo o toque do sino feito através de uma corrente de ferro colocada a toda a altura da torre da igreja matriz
Em 27, 28 e 29 de Outubro de 1956 grandiosos festejos em honra ao Sto. Amaro na Costa Nova
ANDADOR era o termo utilizado em Ílhavo para o músico que tinha que avisar os seus colegas, quando surgia algum serviço de última hora para a banda efectuar, como por exemplo um funeral. As Filarmónicas chegavam a adquirir uma bicicleta para colocar à disposição do Andador e este poder assim melhor desempenhar o trabalho. Rosalino Bernardo da Perpétua foi nomeado Andador da Música Velha em Novembro de 1924
A FEIRA DO S. MARTINHO NA VISTA ALEGRE
NOTAS DESAFINADAS DO REPÓRTER
O S. Martinho! Esta feira original que vive radicada na alma do povo é uma festa
que não envelhece nunca. Palavra. Vivem-se longas horas de agitação, vivas horas
de sã alegria. A alma do povo é sempre aquela criança ingénua que anda perdida
numa ilusão alegre.
Mas vamos à feira. Este ano, como quase sempre, a concorrência foi
extraordinária. É uma multidão anónima que vagueia presa duma preocupação
estranha. Aquela gente procura tudo, percorre tudo sem muitas vezes precisar de
coisa alguma. Esta ida à feira é uma obrigação tradicional a que se não pode
fugir.
Mas a feira modernizou-se. É um S. Martinho (Deus me perdoe) papo-seco com as
suas extravagâncias.
Sério. Os suínos compram-se doutro modo e esta gente desvairada que nada em
notas sem nunca tomar banho (que cheiro ali se denota) já fala e compra doutro
modo.
- Quanto vale o gajo? Vamos?
- 10 notas. Nem menos um centavo.
Aquilo é uma balbúrdia jazz bandística, uma barulheira desta hora. Compra-se
tudo por notas. Doze notas, 8 notas, enfim, um mar de notas bem solfejadas em
cadência de fusas aumentadas de valor.
Raios partam as notas e os porcos. Aquele recinto é quase bolchevista, é um
recinto de todos para todos, mas onde todos compram quando falam... notas.
Um recinto mal cheiroso e miserável. Há porcos tétricos e desconfiados que
parecemos ter já a ver a faca brilhante, coçando-se no alguidar. Se as caras dos
porcos são de meter medo a sete, as caras dos donos e dos compradores são
horrendamente desconfiadas.
É assim mesmo.
Mas vamos ao largo aristocrático da feira. Ali já há uma civilidade encadernada
em chippons e étamines. É um largo titular, mesmo quase elegante.
Há barracas, tendas e tendinhas com lenços berrantes acenando num grito.
As fazendas lutuosas e tecidos tétricos estão escondidos. À vista está tudo o
que chama, tudo o que provoca. Muitas gaitinhas, facas e canivetes. Mas tudo
mudado. A loiça churra, a loiça pobre tem umas legendas hilariantes. No rebordo
dos pratos lê-se: “Oh patego olha o balão!”. “Oh Micas enxota o pito!”. Ao lado
um melro dedilha numa banza o corrido. A mulher canta:
Vamos marido amado
Procurar nossos filhinhos
Foram comidos pelas feras
Ou então com fome coitadinhos
A cinco tostões o folheto. A cinco tostões. Olha o grande crime. Um malvado
assassino que matou dois irmãos, um de sete anos e outro de quatro e depois
retalhou-os deitando-os a um valado!!!
Oh alma ingénua do povo que paras deslumbrado à volta da grande vigarice! E os
folhetos são disputados com ânsias.
Agora estamos no local das frutas. Um arraial de maçãs frescas e coradinhas, um
regimento de nozes e castanhas e um estendal de sertãs fritando postas enormes
de bacalhau enrodilhado em farinha. Nas mesas come-se devoradamente. Há
frigideiras de carneiro untuoso e gordurento que deitam um cheiro capaz de
substituir um almoço. Em cima dum cheiro daqueles bebia-se um copo. Mais adiante
vendem-se panelas, serras, machados, chancas, cestos, martelos, lanças,
cobertores, etc.. tantos cobertores e tanto frio!
Seguimos para a feira da madeira. Ali há alguma coisa de triste e enfadonho.
Pouco movimento. É a feira poesia com a ria lá em baixo a correr e os barcos
sacudidos, aproados à terra.
Há jarras, cântaros e batatas. Cacetes e cestinhos para vistas. Voltamos ao
bulício. O mesmo barulho. As cachopas cantam e empurram-se como doidas. Os
porcos lá estão. Sempre o mesmo jogo de notas, a mesma inundação da papelada que
traz tudo maluco. Regressamos. Os pobres ladeando a estrada cantam a sua lamúria
rotineira.
E quase ninguém os vê, pouca gente os ouve. As vendedeiras do fatico desenrolam a sua ladainha. Lá estão a Rosa e a Margarida:
- Vá, leve este casaco que está novo.
A feira de S. Martinho.
S. Martinho, S. Martinho!
Até ao ano, até ao ano!
De regresso, já toda aquela gente anónima cantava num entusiasmo de quem vem
duma animada romaria:
Ora borda, rica filha,
Borda, borda,
Ora borda, rica filha
Borda bem.
Lá em casa, rica filha
Tudo borda,
Borda o pai, borda a filha
Borda a mãe.
13-11-1925
J.R.
Fotos de A. Vieira da Silva